TJSC. Quebra
de sigilo bancário da ex-companheira do 'de cujus.' Medida excepcional.
Necessidade de esgotamento de outras vias. Questão de alta indagação e que
depende de outras provas. Matéria a ser analisada nas vias ordinárias. Art. 984
do CPC
Data:
04/11/2013
"A
quebra de sigilo bancário é medida excepcional que se comporta acolhimento
quando comprovada a impossibilidade de utilização de outras vias. Ademais, o
processo de inventário não comporta a análise de questões de alta indagação ou
que necessitem de outras provas, devendo as partes recorrerem às vidas
ordinárias - art. 984 do CPC)".
Íntegra
do v. acórdão:
Acórdão:
Agravo de Instrumento n. 2008.004530-7, de Ituporanga.
Relator:
Des. Henry Petry Junior.
Data
da decisão: 18.11.2008.
EMENTA:
AGRAVO DE INSTRUMENTO. DIREITO DAS SUCESSÕES. INVENTÁRIO. 1. AVALIAÇÃO DOS BENS
DEIXADOS PELO DE CUJUS. DETERMINAÇÃO DA VENDA JUDICIAL DOS AUTOMÓVEIS.
INTERESSE DE UMA HERDEIRA (INVENTARIANTE) EM ADJUDICAR UM DOS VEÍCULOS PELO
VALOR DA AVALIAÇÃO. DESINTERESSE DOS DEMAIS HERDEIROS EM FAZÊ-LO. PREFERÊNCIA
DA ADJUDICAÇÃO EM RELAÇÃO À VENDA JUDICIAL. ART. 2.019, § 1°, DO CC/2002. 2.
QUEBRA DE SIGILO BANCÁRIO DA EX-COMPANHEIRA DO DE CUJUS. MEDIDA EXCEPCIONAL.
NECESSIDADE DE ESGOTAMENTO DE OUTRAS VIAS. QUESTÃO DE ALTA INDAGAÇÃO E QUE
DEPENDE DE OUTRAS PROVAS. MATÉRIA A SER ANALISADA NAS VIAS ORDINÁRIAS. ART. 984
DO CPC. PROVIMENTO PARCIAL DO RECURSO. 1. "[...], a adjudicação ao
herdeiro, ao cessionário ou ao cônjuge sobrevivente, prefere à venda judicial
no condomínio derivado da herança. Pode ela ser requerida a qualquer tempo;
enquanto não realizada a praça, assiste ao interessado direito de pleiteá-la
para si, não podendo, a respeito, falar-se em preclusão. Para essa adjudicação,
torna-se desnecessário o assentimento dos demais herdeiros. [...]. Não
constitui obstáculo à adjudicação a existência de herdeiro menor ou interdito.
[...]. (MONTEIRO, Washington de Barros. Curso de Direito Civil – Direito das
Sucessões. Vol. 6. São Paulo: Saraiva, 2003. p. 328) 2. A quebra de sigilo
bancário é medida excepcional que se comporta acolhimento quando comprovada a
impossibilidade de utilização de outras vias. Ademais, o processo de inventário
não comporta a análise de questões de alta indagação ou que necessitem de
outras provas, devendo as partes recorrerem às vidas ordinárias – art. 984 do
CPC).
Vistos,
relatados e discutidos estes autos de Agravo de Instrumento n. 2008.004530-7,
da comarca de Ituporanga (2ª Vara), em que é agravante Márcia Arndt Brandt, e
agravados Ana Salete de Menezes, Eliane Arndt Kitzberger e Gustavo Henrique de
Souza:
ACORDAM,
em Terceira Câmara de Direito Civil, por votação unânime, conhecer do recurso e
dar-lhe parcial provimento. Custas legais.
RELATÓRIO
Trata-se
de agravo de instrumento interposto por Márcia Arndt Brandt contra a decisão
interlocutória proferida na ação de inventário n. 035.04.000989-5, na qual a
agravante figura como inventariante, na condição de filha. Argumentou que, dentre
os bens deixados pelo de cujus, encontra-se o automóvel caminhonete Ford F-250
XLT, no qual tem interesse, motivo por que requereu ao juízo singular sua
adjudicação.
Liberado
o alvará judicial para transferência do bem para seu nome, o magistrado, posteriormente,
determinou nova avaliação do bem e sua posterior venda judicial, negando o
direito da herdeira em permanecer com o veículo que, inclusive, já se
encontrava registrado em seu nome junto ao Detran.
Ainda,
após reiterados pedidos para que fosse realizada a quebra do sigilo bancário da
ex-companheira do de cujus, visto haver indícios de sonegação de bens a serem
partilhados, o magistrado indeferiu o pleito, naquela mesma oportunidade.
Busca,
assim, a concessão do efeito suspensivo ao recurso e posterior reforma dessa
decisão a fim de ser mantido seu direito à adjudicação do automóvel, bem como o
deferimento da quebra do sigilo bancário da herdeira Ana Salete de Menezes.
Acostou
documentos às fls. 16-439.
Em
decisão monocrática às fls. 457-466, o Desembargador Subst. Robson Luz Varella
negou seguimento ao pleito de adjudicação do automóvel, bem como não concedeu
efeito suspensivo ao recurso.
Pedido
de reconsideração formulado às fls. 469-472 e negado às fls. 474-482.
Intimados
os agravados, apenas a herdeira Eliane Arndt Kitzberger apresentou
contra-razões recursais (fls. 496-502), no sentido do desprovimento do agravo,
permanecendo os demais inertes (fl. 506).
Parecer
da Procuradoria-Geral de Justiça, de lavra do Procurador Paulo Roberto de
Carvalho Roberge, no sentido desprovimento do recurso (fls. 509-510).
É o
relatório possível e necessário.
VOTO
1. A
admissibilidade do recurso
Argumenta
a agravada Eliane Arndt Kitzberger, em contra-razões ofertadas às fls. 496-502,
que o recurso não deve ser conhecido, pois não foram cumpridos os requisitos do
art. 524 do Código de Processo Civil, visto que a agravante não teria indicado
o nome e o endereço completo dos advogados dos agravados (inciso III do art.
524 do CPC).
Ocorre
que, ainda que a agravante não tenha separado os documentos na ordem descrita
no referido artigo do Código de Processo Civil, tais peças se encontram
anexadas à inicial, juntamente com os demais documentos pertinentes ao caso
(fls. 16-439).
À fl.
25 há cópia da petição da herdeira Ana Salete de Menezes requerendo sua
habilitação no inventário, sendo que, logo em seguida (fl. 26), encontra-se a
procuração outorgada ao seus advogados, com o endereço profissional devidamente
delimitado.
Já o
herdeiro Gustavo Henrique de Souza, menor impúbere representado pelo pai Sérgio
Maurício de Souza, habilitou-se no inventário conforme comprova o documento de
fls. 27-28, estando sua procuração, com o delineamento dos profissionais,
acostada à fl. 30.
Por
fim, a herdeira Eliane Ardnt Kitzberger habilitou-se no inventário em petição
constante à fl. 32, estando a procuração acostada à fl. 33.
Desse
modo, satisfeitos esses e os demais pressupostos de admissibilidade, conheço do
recurso.
2. Do
mérito
Dois
são os pedidos formulados pela agravante no presente recurso: 1) manutenção do
automóvel Ford F-250 XLT em sua propriedade, decorrente da adjudicação do bem
que lhe é permitida pela legislação pátria; e 2) quebra do sigilo bancário da
herdeira Ana Salete de Menezes, a fim de apurar eventual sonegação de bens ao
inventário.
É
certo que em juízo monocrático negou-se o seguimento ao primeiro pleito
recursal – adjudicação do automóvel (fls. 457-466). Porém, não só o Código de
Processo Civil autoriza a reforma dessa decisão quando do julgamento do agravo
– Art. 527, parágrafo único, do CPC: "A decisão liminar, proferida nos
casos dos incisos II e III do caput deste artigo, somente é passível de reforma
no momento do julgamento do agravo, salvo se o próprio relator a
reconsiderar" –, como o próprio prolator daquela decisão ressalvou essa
hipótese quando da análise do pedido de reconsideração (fls. 474-482).
Cumpre,
então, analisar cada um dos pleitos de forma individualizada.
Adjudicação
do automóvel
Da
leitura dos documentos anexados aos autos pela agravante, e que fazem parte do
processo de inventário n. 035.04.000989-5, tem-se que dentre os bens deixados
pelo de cujus, pai da inventariante (Celso Arndt), encontravam-se dois veículos
automotores, sendo um Vectra CD e um Ford F-250. Ante os gastos desnecessários
suportados pelo espólio com esses bens e suas gradativas deteriorações, a
inventariamente requereu autorização para venda dos automóveis, com a expedição
de alvará judicial para tanto (fls. 105-106).
O
Ministério Público a quo, à fl. 110, manifestou-se pela autorização da venda
dos veículos, desde que precedidas suas avaliações e devendo a alienação
ocorrer dentro dos valores apurados pelo expert nomeado pelo juízo.
Em
decisão constante à fl. 131, o magistrado singular determinou a avaliação desses
e dos demais bens deixados pelo de cujus, salientando que, quanto aos
automóveis, ficava assegurada sua venda particular pela inventariante,
respeitados, sempre, os valores das avaliações e posteriormente prestadas
contas dos valores apurados, com seus depósitos vinculados ao juízo.
Saliente-se
que as herdeiras Ana Salete de Menezes (fls. 186-187) e Eliane Ardnt Kitzberger
(fls. 197-198) concordaram expressamente com a venda dos veículos.
Entregue
o laudo de avaliação formulado pelo perito (fl. 260) – Ford F-250 no valor de
R$ 52.000,00 (cinqüenta e dois mil reais) – a agravante requereu a adjudicação
do bem, solicitando que o valor fosse descontado da parte que venha a lhe caber
na partilha.
Sem
nenhuma decisão acerca desse pedido, foram expedidos dois alvarás, datados de
18 e 29 de agosto de 2006 e devidamente assinados pelo magistrado singular,
autorizando que a inventariante (agravante) efetuasse a venda do veículo Vectra
(fl. 264) e a transferência do automóvel Ford F-250 (fl. 263). Da posse desses
documentos, a autora transferiu para seu nome o automóvel Ford F-250, conforme
faz prova o documento de consulta de veículo do Detran (fl. 379).
Porém,
em 17 de maio de 2007, o magistrado singular proferiu nova decisão, nos
seguintes termos:
1.
Determino nova avaliação do veículo FORD PICK-UP F-250 XLT L, COR CINZA, MARCA
FORD, ANO/MODELO 2002, PLACA MBJ 2304, RENAVAN 786406424, para tanto, nomeio
avaliador do juízo Cláudio Geovane Becker. Expeça-se mandado de avaliação.
2.
Efetuada a avaliação, deverá o bem ser entregue em uma concessionária para que
seja procedida a venda (por valor igual ou inferior (sic) ao da avaliação) e
deverá a inventariante prestar contas, depositando o valor em juízo no prazo de
30 dias. (fl. 342).
Dessa
decisão (item n. 2) é possível se extrair, ainda que não expressamente
ressaltado pelo magistrado, que a adjudicação requerida pela inventariante – e
até então ainda não analisada, embora expedido erroneamente alvará para
transferência do veículo (fl. 263) – foi negada, mesmo que não haja motivos nos
autos para tanto.
Opôs a
inventariante, então, embargos declaratórios, com pleito infringente, a fim de
manter a adjudicação do bem já realizada, inclusive com a transferência do
automóvel para seu nome (fls. 374-375), o que foi negado às fls. 383-386 sob o
seguinte argumento:
Oportuno
mencionar que, em momento algum este juízo autorizou a transferência do veículo
F-250, placa MBJ 2304 em favor da inventariante, muito menos para que o valor
seja descontado da sua parte na herança, embora expedido alvará de forma
equivocada à fl. 246.
Assim,
ante o exposto, REJEITO os presentes embargos declaratórios. (fl. 385).
Nos
termos do art. 2.019 do Código Civil de 2002, "os bens insuscetíveis de
divisão cômoda, que não couberem na meação do cônjuge sobrevivente ou no
quinhão de um só herdeiro, serão vendidos judicialmente, partilhando-se o valor
apurado, a não ser que haja acordo para serem adjudicados a todos". Porém,
no caso de interesse de um dos herdeiros em adjudicar o bem, "não se fará
a venda judicial" (§ 1º do art. 2.019 do CPC).
CARLOS
ROBERTO GONÇALVES, na obra Direito Civil Brasileiro – Direito das Sucessões,
Vol. III, Editora Saraiva, ano 2007, ensina que:
A
adjudicação ao herdeiro, ao cessionário ou ao cônjuge sobrevivente prefere,
portanto, à venda judicial no condomínio derivado da herança. Pode ela ser
requerida a qualquer tempo, enquanto não realizada a praça. Para essa
adjudicação, torna-se desnecessário o assentimento dos demais herdeiros. No
entanto, se mais de um a pleitear, impor-se-á a licitação.
A lei
confere hipoteca "ao co-herdeiro, para garantia do seu quinhão ou torna da
partilha, sobre o imóvel adjudicado ao herdeiro reponente" (CC, art.
1.489, IV). (p. 527) (grifo nosso).
SÍLVIO
DE SALVO VENOSA vai nessa mesma linha da raciocínio, acrescentando que:
A
venda em hasta é quase sempre desfavorável. Podem os herdeiros concordar com
uma venda independente de hasta, que poderá ser mais vantajosa. Os herdeiros
terão, de qualquer forma, preferência na aquisição do bem, repondo em dinheiro
a diferença (art. 2.019, § 1°). Se a adjudicação for requerida por mais de um
herdeiro, serão observadas as regras da licitação (art. 2.019, § 2°). [...].
A
outra regra diz respeito à comunidade dos herdeiros. O herdeiro que já detém a
posse de um bem deve preferentemente ficar com ele. [...]. (in: Direito Civil –
Direito das Sucessões. 3 ed. São Paulo: Atlas, 2003. p. 389) (grifo nosso).
Por
fim, há o ensinamento de WASHINGTON DE BARROS MONTEIRO, valioso para a
corroboração das teses anteriores:
De
conformidade com esses preceitos legais, a adjudicação ao herdeiro, ao
cessionário ou ao cônjuge sobrevivente, prefere à venda judicial no condomínio
derivado da herança. Pode ela ser requerida a qualquer tempo; enquanto não
realizada a praça, assiste ao interessado direito de pleiteá-la para si, não
podendo, a respeito, falar-se em preclusão. Para essa adjudicação, torna-se
desnecessário o assentimento dos demais herdeiros. [...]..
Não
constitui obstáculo à adjudicação a existência de herdeiro menor ou interdito.
Nesse caso, porém, determina-se nova avaliação, que atribua aos bens valor real
ou venal. [...]. (in: Curso de Direito Civil – Direito das Sucessões. Vol. 6.
São Paulo: Saraiva, 2003. p. 328) (grifo nosso).
Tendo
essas questões em conta, e não havendo interesse por nenhum outro dos herdeiros
na adjudicação do automóvel em questão, não há razão para ser negado à
inventariante (agravante) o direito a ficar com o bem, inclusive porque,
conforme destacaram os herdeiros em diversas oportunidades, mesmo antes da
transferência do bem para seu nome, a agravante já detinha a posse do veículo
desde a abertura do inventário.
Além
disso, reitere-se que os demais herdeiros – ainda com um deles sendo menor –
não podem se opor à adjudicação, salvo se também tiverem interesse em ficar com
o bem, quando então o magistrado deverá realizar leilão para solucionar o
litígio (art. 2.019, § 2º, do CC/2002), o que não é o caso.
Entender
de forma diversa seria ir de encontro aos ditames legais – preferência da
adjudicação à venda judicial –, bem como importaria na anulação da
transferência já realizada junto ao Detran com o alvará de fl. 263, retardando
sobremaneira a venda judicial e implicando em uma crescente desvalorização do
automóvel, prejudicando, daí sim, os interesses de todos os herdeiros,
principalmente do menor Gustavo Henrique de Souza.
Eis os
precedentes que se ajustam ao caso:
1)
AGRAVO DE INSTRUMENTO - AÇÃO DE INVENTÁRIO - PEDIDO DE ADJUDICAÇÃO COM SUPORTE
NO ARTIGO 2.019 DO CC - RECURSO CONHECIDO E PROVIDO
Antes
de decidir e de autorizar a venda do bem, o juiz deve ouvir as partes, a fim de
possibilitar o pedido de adjudicação e, caso não haja interessado, determinar a
realização da hasta pública para alienação dos bens. (TJSC. Agravo de
Instrumento n. 2004.031218-9, de Jaguaruna. Terceira Câmara de Direito Civil.
Relator: Des. JOSÉ VOLPATO DE SOUZA. Decisão em 04/02/2005).
2)
INVENTÁRIO. DECLARAÇÃO DA PARTILHA. POSSIBILIDADE DE ADJUDICAÇÃO DO BEM PELO
HERDEIRO. APELO IMPROVIDO. A DECLARAÇÃO DA PARTILHA MOSTRA-SE NECESSÁRIA, NA
MEDIDA EM QUE INDIVIDUALIZA OS QUINHÕES CABÍVEIS AOS HERDEIROS QUANTO AO
ESPÓLIO.
Considerando-se
que aqueles se submetem ao regime de condomínio, a venda dos bens componentes
da herança a terceiro apenas será possível caso não haja desejo de adjudicação
por parte de um dos sucessores. (TJBA. AC 18799-7. Ac. 4867, de Salvador.
Quarta Câmara Cível. Relª Desª CELSINA REIS. Decisão em 23/04/1997); e
3)
INVENTÁRIO. VENDA EM HASTA PUBLICA DE IMÓVEL DE ESPÓLIO. IMÓVEL INSUSCETÍVEL DE
DIVISÃO CÔMODA. ADJUDICAÇÃO A HERDEIRO. FALTA DE MANIFESTAÇÃO DE HERDEIRO.
SUSTACAO DE LEILÃO. AGRAVO DE INSTRUMENTO. INVENTÁRIO.
Imóvel
que não couber no quinhão de um só herdeiro ou não admitir divisão cômoda.
Adjudicação preferencial aos respectivos herdeiros. Realização da venda do
imóvel questionado com a intermediação de corretor imobiliário. Inteligência do
art. 700, do código de processo civil. Decisão agravada cassada. Feito chamado
à ordem. Leiloamento sustado. Recurso provido. (TJRJ. AI 1763/1994, do Rio de
Janeiro. Sétima Câmara Cível. Rel. Des. CELSO GUEDES. Decisão em 09/05/1995).
Contudo,
em consulta ao Sistema de Automação Judiciária (SAJ), observa-se que já foi
realizada nova avaliação do referido automóvel – 24 de julho de 2008 –,
alterando-se seu valor para R$ 55.000,00 (cinqüenta e cinco mil reais), ou
seja, R$ 3.000,00 (três mil reais) acima do valor apurado na primeira
avaliação.
Desse
modo, preservando o melhor interesse dos herdeiros, principalmente em razão de
um deles ser menor, este deverá ser o valor do bem a ser considerado para a
adjudicação da agravante.
Igualmente,
ficam ressalvados os ditames do art. 2.019, § 1º, última parte, do CC/2002, no
que pertine à reposição, aos demais herdeiros, em dinheiro, da diferença do
quinhão que cabe à adjudicante quanto ao veículo em discussão.
RICARDO
FIUZA esclarece que, no caso de adjudicação, "quem ficar com o bem reporá
aos outros, em dinheiro (torna), a diferença, após avaliação atualizada
(pretium succedit in loco rei)" (in: Novo Código Civil Comentado. São
Paulo: Saraiva, 2002. p. 1819). Ou seja, caberá ao herdeiro adjudicante
depositar, em favor dos demais herdeiros, a diferença de valores do bem
adjudicado que não lhe caibam, ou seja, que ultrapassem sua cota-parte sobre o
automóvel.
Precedente
nesse sentido:
AGRAVO
DE INSTRUMENTO. SUCESSÕES. INVENTÁRIO. ALIENAÇÃO JUDICIAL DO ÚNICO BEM IMÓVEL
INVENTARIADO. DIREITO À ADJUDICAÇÃO PELO HERDEIRO INTERESSADO. ART. 2.019, §
1º, DO CÓDIGO CIVIL.
Havendo
um único bem a inventariar, e sendo este insuscetível de ser dividido em
quinhões aos herdeiros, a hipótese é de adjudicação do imóvel, por avaliação
atualizada, ao herdeiro interessado em adquirir o bem, repondo a diferença do
preço aos demais. Exegese do art. 2.019 do Código Civil. Precedentes desta
Corte e do STJ. AGRAVO DE INSTRUMENTO PROVIDO. (TJRS. AI 70023347040, de Bento
Gonçalves. Sétima Câmara Cível. Rel. Des. ANDRÉ LUIZ PLANELLA VILLARINHO.
Decisão em 28/05/2008) (grifo nosso).
Impossibilitada,
portanto, a compensação do valor integral do bem com os valores que a
adjudicante teria a receber no momento da partilha, até porque, no presente
momento, com as provas carreadas aos autos, não é possível se verificar qual a
porcentagem dos bens do espólio que o veículo em questão representa.
Igualmente,
ressalta-se que a presente discussão, por estar no âmbito restrito do agravo de
instrumento, não admite que se reconheça o direito de a herdeira Ana Salete de
Menezes (ex-companheira do de cujus) sobre parte do automóvel adjudicado. Fica
para o primeiro grau, portanto, a verificação de quantos são os herdeiros que
fazem jus a cotas-partes do automóvel em questão, delimitando, com isso, o
montante a ser depositado pela inventariante/adjudicante (art. 2.019, § 1°,
última parte, do CC/2002).
Por
fim, de se salientar que, todas as multas e despesas afins do referido veículo
no período em que a agravante detinha sua posse e livremente o utilizava,
principalmente após a transferência para seu nome no órgão de trânsito
(Detran), ficam sob sua responsabilidade, não incumbindo ao espólio arcar com
os valores daí decorrentes.
Quebra
do sigilo bancário
Não
merece provimento, contudo, o pleito da agravante de quebra do sigilo bancário
da herdeira Ana Salete de Menezes, ex-companheira do extinto Celso Arndt (de
cujus).
O
Superior Tribunal de Justiça, em diversas oportunidades, manifestou-se acerca
da excepcionalidade da quebra de sigilo bancário, sendo necessário que a parte
que o requer comprove o esgotamento de todas as outras vias possíveis: 1) STJ.
AgRg-Ag 982.780. Proc. 2007/0280176-5, de SP. Terceira Turma. Rel. Min. MASSAMI
UYEDA. Decisão em 15/05/2008; 2) STJ. AgRg-REsp 1.041.181. Proc.
2008/0060998-6, de SP. Segunda Turma. Rel. Min. HUMBERTO MARTINS. Decisão em
27/05/2008; e 3) STJ. AgRg-Ag 987.106. Proc. 2007/0281746-9, da BA. Primeira
Turma. Rel. Min. JOSÉ AUGUSTO DELGADO. Decisão em 06/05/2008.
Na
espécie, a agravante não comprovou o esgotamento de outras vias capazes de
apontar a sonegação de bens pela herdeira Ana Salete de Menezes. Mais. Não
trouxe sequer indícios desse fato, o que poderia ser conseguido a partir de
certidões expedidas pelos Cartórios de Registro de Imóveis da região ou pelo
Detran, este no que tange à veículos automotores.
Ademais,
o Código de Processo Civil, em seu art. 984, estabelece que as questões que
demandarem alta indagação, ou dependerem de outras provas, deverão ser
remetidas às instâncias ordinárias, pois tumultuam o andamento do inventário,
enquadrando-se o pleito de quebra de sigilo bancário nessa hipótese.
Eis um
julgado do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro que se amolda perfeitamente ao
caso e elucida a questão:
AGRAVO
DE INSTRUMENTO. INVENTÁRIO. PRETENSÃO DE EXPEDIÇÃO DE OFÍCIOS PARA CONHECIMENTO
DE OPERAÇÕES BANCÁRIAS EM PERÍODO ANTERIOR AO FALECIMENTO DO AUTOR DA HERANÇA.
ALEGAÇÃO DE EXISTÊNCIA DE COISA JULGADA MATERIAL E POSSIBILIDADE DE QUEBRA DE
SIGILO BANCÁRIO, DE CONVIVENTE DO DE CUJUS.
Embora
o processo de Inventário tenha aspectos de natureza administrativa ou
voluntária e aspectos de natureza contenciosa, as questões de maior indagação
se resolvem nas vias ordinárias, ex vi legis. [...]. (TJRJ. AI 2007.002.06692.
Décima Oitava Câmara Cível. Rel. Des. Conv. PEDRO FREIRE RAGUENET. Decisão em
26/03/2007).
Do
corpo dessa decisão se extrai:
Com
efeito, a doutrina é clara no sentido de que, embora o processo de inventário
ostente caráter misto, em que se tem parcela que é administrativa e parcela que
pode se tornar contenciosa, há limitação no alcance desta última, que não pode
se converter em processo de conhecimento.
Tanto
assim o é que há a expressa disposição do art. 984 do CPC de que em casos que
tais, as questões de alta indagação serão resolvidas pelas vias ordinárias e
não nos autos de Inventário. (apud Arnaldo Rizzardo, "Direitos das
Sucessões", Rio de Janeiro, ed. Forense, 2a ed., 2006, pg. 587).
Com
efeito, se entende o Inventariante, filho do de cujus, que a Agravada,
convivente deste, tenha se assenhorado de forma indevida de parcela de
patrimônio deixado por aquele, deverá se socorrer, sim, das vias próprias para
o exercício de seus direitos, assim como para comprovar a existência da alegada
fraude que teria ocorrido, com lesão a seus direitos.
Mais
ainda, tal pretensão implica em quebra de sigilo bancário envolvendo a
agravada, o que não se prestigia, posto que e se repete, o Inventário não será
o local apropriado para tal fim, devendo o interessado se socorrer dos meios
próprios para satisfação da sua pretensão.
Esta
Terceira Câmara de Direito Civil também já teve oportunidade de se manifestar
acerca do assunto: 1) Agravo de Instrumento n. 2007.051975-1, de Rio Negrinho
terceira Câmara de Direito Civil. Relatora: Desa. MARIA DO ROCIO LUZ SANTA
RITTA. Decisão em 27/05/2008; 2) Agravo de Instrumento n. 2007.024346-7, de
Lages. Terceira Câmara de Direito Civil. Relator: Des. FERNANDO CARIONI.
Decisão em 17/12/2007; e 3) Apelação Cível n. 2006.007552-4, da Capital /
Distrital do Norte da Ilha. Terceira Câmara de Direito Civil. Relator: Des.
MARCUS TULIO SARTORATO. Decisão em 16/10/2007.
Negado,
portanto, o pleito de quebra de sigilo bancário da ex-companheira do de cujus.
3.
Conclusão
Em
resumo, conhece-se do recurso interposto e dá-se-lhe parcial provimento, nos
seguintes termos:
1.
Permitir que a agravante adjudique o automóvel Ford F-250, placas MBJ 2304,
pelo valor da última avaliação – R$ 55.000,00 (cinqüenta e cinco mil reais),
observados, ainda, os ditames do art. 2.019, § 1°, do CC/2002, ou seja, a
adjudicante deverá depositar o valor do veículo que ultrapasse a cota-parte que
dele lhe caiba; e
2.
Negar o pleito de quebra do sigilo bancário da herdeira Ana Salete de Menezes.
Comunique-se,
com urgência, o juízo singular acerca do conteúdo desta decisão.
DECISÃO
Ante o
exposto, por unanimidade, a Câmara decide conhecer do recurso e dar-lhe parcial
provimento, nos termos supra.
O
julgamento, realizado nesta data, foi presidido pelo Exmo. Sr. Des. Fernando
Carioni, com voto, dele participando o Exmo. Sr. Des. Marcus Tulio Sartorato.
Florianópolis,
18 de novembro de 2008.
Henry
Petry Junior
RELATOR
Nenhum comentário:
Postar um comentário