04 de julho de 2007.
JORNAL DO COMMERCIO - DIREITO & JUSTIÇA
O número de casos de assédio moral nas empresas tem crescido. Levantamento realizado pela advogada Karla Bernardo, da Pactum Consultoria Empresarial, junto ao Ministério Público do Trabalho (MPT), revela que o órgão abriu, somente no ano passado, 337 investigações para apurar denúncias envolvendo a submissão de empregados a situações constrangedoras. A Justiça especializada, no entanto, já contabiliza há algum tempo o saldo da maior predisposição apresentada pelo trabalhador em buscar seus direitos. Consulta feita pela ministra Maria Cristina Peduzzi, do Tribunal Superior do Trabalho (TST), indica que a questão já foi analisada por quase todas as 24 cortes trabalhista do País. De acordo com a pesquisa, em 2006, os tribunais julgaram 600 recursos sobre o tema - metade da demanda registrada em 2004.
Na avaliação de Karla Bernardo os dados disponíveis representam apenas uma pequena parcela da real demanda. Embora o assédio moral seja uma questão relativamente nova no ordenamento jurídico brasileiro (surgiu efetivamente a partir de 2000), a advogada acredita que a demanda se tornou cada vez mais crescente porque o trabalhador passou a ter mais acesso aos seus direitos. "Os empregados estão tomando pé da situação e estão correndo atrás", disse a especialista.
Outro fator apresentado por Karla Bernardo está relacionado à dificuldade ainda existente de se distinguir assédio moral de atritos entre empregador e empregado. A advogada explica que, entre as características do assédio moral, estão a regularidade dos ataques, que geralmente se prolongam por meses, e a determinação de desestabilizar emocionalmente o trabalhador, com objetivo claro de afastá-lo do trabalho. "No mínimo a gente deduz que o ato era doloso (intencional)", afirmou.
Segundo a especialista, não existe lei federal sobre o assunto. Tentando evitar a proliferação desse tipo de causa, alguns estados e municípios editaram normas para coibir o assédio moral dentro das empresas públicas. Nesse aspecto, o Rio de Janeiro foi pioneiro. Em 2002, foi sancionada a Lei nº 3.921 que, entre outras temas, tratou do rol de situações que ensejariam assédio moral.
Na lista constam situações como a que são atribuídas ao trabalhador tarefas estranhas ou incompatíveis com o cargo, ou em condições e prazos inexeqüíveis. Também ela legislação, designar funcionários qualificados ou especializados para funções triviais; apropriar-se de idéias, propostas, projetos ou trabalhos; e torturar psicologicamente, desprezar, ignorar ou humilhar o servidor, isolando-o de contato com os colegas e superiores hierárquicos configuram assedio moral.
De acordo com a advogada, a falta de uma legislação-padrão sobre o tema tem levado o Judiciário Trabalhista a aplicar os dispositivos legais a interpretações sistemáticas. É o caso, por exemplo, do artigo 818 da Consolidação das Leis do Trabalho, que trata da dispensa indireta - instrumento utilizado pelo empregado para romper o vínculo empregatício, sem perder seus direitos, quando a empresa não cumpre o contrato de trabalho. "Nesse caso é possível enquadrar o assédio quando o trabalho exigido é superior a capacidade do trabalho, quando este for tratado com rigor excessivo, ou quando há perigo de mal considerável", ressaltou.
Para o advogado Marco Lotti, da banca Lotti & Araújo Advogados, é preciso ter cuidado para que não seja instituída nas cortes trabalhistas uma indústria do dano moral decorrente de um relacionamento conflituoso entre empregado e trabalhador. "Hoje, no processo, entre outros pedidos, se busca com maior voracidade o (reconhecimento do) assédio moral. E grande maioria está calcada numa busca intempestiva", destacou o especialista em Direito do Trabalho, ressaltando que as denúncias de assédio precisam ser comprovadas. "Essa é uma matéria fatica, precisa, então, ser provada", afirmou.
Na opinião do advogado, a tendência é que esse tipo de ação cresça nos tribunais do Trabalho. Em parte pelas indenizações, em muitos casos, vultosas determinadas pelas cortes. Os valores das condenações em processos individuais, na maior parte dos casos, variam entre R$ 10 mil e R$ 30 mil. Não é raro, porém, a existência de condenações milionárias.
Exemplo disso é a ação civil pública movida pelo MPT do Rio Grande do Norte, a AMBEV (Companhia de Bebidas das Américas). A empresa foi condenada pela Justiça do Trabalho ao pagamento de R$ 1 milhão por assédio moral praticado contra os funcionários que não atingiam as cotas de vendas pré-fixadas. Muitos foram submetidos a insultos e obrigados a realizar "prendas". Entre elas, pagar flexões, dançar "na boquinha da garrafa", a assistir a reuniões em pé e fantasiar-se.
Segundo o advogado, a indenização tem por objetivo não só reparar o dano ao trabalhador, como também punir a empresa pela conduta irregular. "Deverá aumentar (o número de ações) até porque existe uma tendência em se buscar a indenização. Então, esse aumento é explicável", afirmou Lotti.
CONDUTA. O levantamento realizado pela advogada Karla Bernardo mostra também aumento no número de termos de ajustamento de conduta firmados pelas empresas junto ao MPT. Quinze procuradorias regionais do Trabalho de 15 registram 48 acordos. Nos últimos 11 meses, dez ações civis públicas foram encaminhadas pelos procuradores do Trabalho à Justiça trabalhista de São Paulo, Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul para pedir reparação por danos causados a trabalhadores assediados moralmente. No ano passado, 32 termos foram assinados pelas empresas.
Para a advogada, o TAC proporciona as empresas à possibilidade de corrigem as atitudes que se caracterizaram como assédio moral. Ela, no entanto, destaca a importância de os empregadores investirem em prevenção. Nesse tocante, vale até a demissão daqueles que não se enquadram na política adotada pela companhia. "Uma empresa está presente por meio de seus representantes (gerentes, supervisores, etc). Por isso, o assediador tem que ser treinado. Se ele continuar (assediando), poderá, inclusive, ser demitido por justa causa", afirmou.
GISELLE SOUZA
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